𝗖𝗢𝗡𝗧𝗥𝗔 𝗢 𝗠𝗔𝗥, 𝗔 𝗟𝗨𝗧𝗔 𝗗𝗜Á𝗥𝗜𝗔

                                                     


Em 1969 - O Salva Vidas trabalhava 24 horas para descansar 24 horas. Recebia um salário como qualquer outro membro da corporação da Força Pública. Existia ordem hierárquica e ele podia trabalhar até os 51 anos.
Dos 129 homens, 80 por cento eram casados. Na temporada, o serviço dobrava por causa do grande numero de turistas que chegavam à cidade, mas o serviço de salvamento de praias não recebia reforço. A única providência para proteger um numero excepcional de banhistas era de não dar férias aos salva-vidas nesse período. Só por dois motivos eram permitidas as licenças durante os meses de dezembro, janeiro, fevereiro e julho: casamento e morte na família. E quando isto acontecia dizia o capitão Barreto, do Corpo de Bombeiros, o afastamento era só por 8 dias.
Além do treino permanente de educação física, natação e salva-vidas era submetido anualmente a um exame completo: abreugrafia, exame parasitológico e um check-up periódico. Outra coisa importante era a vacinação. "A imunização era tão completa, contava o capitão, que os nossos homens costumavam brincar que todos os anos recebiam vacinas até contra casamento".

𝗗𝗢𝗜𝗦 𝗠𝗢𝗥𝗥𝗘𝗥𝗔𝗠
O salvamento de pessoas e embarcações já era uma rotina para os salva-vidas. Mas eles também eram encarregados de outros serviços: auxiliavam a polícia na detenção de pessoas que praticavam atos contra o pudor público e encaminhavam crianças perdidas e objetos achados.
Bons mergulhadores eram encarregados de procurar cadáveres e faziam reparos em navios.
O auxilio aos banhistas era feito em casos de perigo ou simplesmente como proteção: muitos colégios e firmas de ofício, segurança para seus alunos funcionários que vinham fazer piqueniques em praias que estava fora da área de salvamento.
O Serviço de Salvamento existia desde 1947 e até 1969, só ocorrera um acidente com os salva-vidas. Em 1968, dois homens foram mandados a Ilha Urubuqueçaba para salvar 4 pessoas do perigo. Depois de coloca-los em local seguro, os dois salva-vidas foram colhidos por uma onda, bateram contra as pedras e morreram.

𝗖𝗢𝗥𝗔𝗚𝗘𝗠 𝗘 𝗗𝗘𝗗𝗜𝗖𝗔ÇÃ𝗢
Cicero Ramos, 47 anos, sentinela avançada durante a 2ª Guerra Mundial. Único da primeira turma de salva-vidas de nossas praias. Depois de salvar 300 pessoas, das quais mais de 100 crianças durante 25 anos de serviço na Força Pública, ele iria se aposentar. Cicero lembrava que em 1947 só existiam postos que tinham como equipamento apenas um sandolin. "Naquele tempo havia mais afogamentos e o serviço era feito com muita coragem".
Um dos seis primeiros serviços foi próximo à Pedra da Feiticeira, na divisa de José Menino com São Vicente, que durante muito tempo foi chamada de cemitério de paulistas. Quando chegou o aviso de afogamento, eu e o outro salva-vidas fomos para lá. Tivemos que ir nadando até o homem, porque o mar não permitia o uso de embarcação. Depois de lutar quase uma hora conseguimos salvar.
"O salva-vidas quando entra no mar para uma missão esquece até a família, mas o reconhecimento das pessoas salvas nunca passa de um muito obrigado". Ela era uma magoa de Cicero que achava que "a maior satisfação do nosso trabalho teria o reconhecimento do povo pelo serviço que prestamos".

𝗣𝗥𝗜𝗠𝗘𝗜𝗥𝗔 𝗠𝗜𝗦𝗦Ã𝗢
Cicero nasceu às margens do rio Potegi, no Rio Grande do Norte. Numa das enchentes um menino de 13 anos foi atravessar o rio montado num cavalo e a correnteza jogou-o fora da sela. Outro menino atirou-se para socorrê-lo. Cicero fazia assim o seu primeiro salvamento.
O maior perigo que o salva-vidas enfrenta é quando a pessoa que está se afogando tenta agarrá-lo. Para evitar isso, antigamente salva-vidas dava uma pancada no pescoço da pessoa evitava ser agarrado. Hoje, o método é outro. Cicero explica:
"Mergulha-se por baixo da vitima a um metro e meio dela e seguга-se por trás. Depois aplicamos uma gravata e colocamos o afogado sobre uma boia. Além disso, temos o pé de pato, que nos dá maior agilidade dentro da água".
Depois de se aposentar, Cicero pretendia voltar com a mulher e o filho para o Rio Grande do Norte. Este serviço é bom para trabalhar uns 8 anos. Depois, vamos ficando com receio, mais temerosos aos perigos que enfrentamos diariamente, porque não temos mais aqueles arrojos da mocidade.

𝗣𝗔𝗥𝗔 𝗦𝗘𝗥 𝗨𝗠 𝗦𝗔𝗟𝗩𝗔-𝗩𝗜𝗗𝗔𝗦
Para ser um salva-vidas era necessário um ano de estudos Intensivos. Havia algumas condições essenciais para conseguir o alistamento na Força Pública: no mínimo 1,70 metro de altura, brasileiro, reservista, alfabetizado, passar em exame clínico, dentário e psicotécnico. Depois de aprovado nesses exames, o candidato que precisava ter 18 anos no minimo ia para a Escola de Infantaria da Força Pública, em São Paulo, e fazia um curso de 4 meses, saindo soldado.
Se o soldado quisesse servir ao Corpo de Bombeiros fazia um curso de três meses, onde recebia todas as instruções a respeito de salvamento no fogo. Com o curso de infantaria e bombeiro, o soldado podia tentar ser um salva-vidas. Entrava então para a escola de recrutas e fazia um curso de três meses.
𝗔 𝗘𝗦𝗖𝗢𝗟𝗔
A escola de recrutas existia desde 1953, quando o comando da Força Pública decidiu que toda a parte de treinamento especializado (salva-vidas, combate a incêndio a bordo) funcionaria em Santos, por força dos requisitos técnicos de locais e meios".
Na escola, os recrutas recebiam instrução sobre educação física, natação, fenômenos marítimos, conhecimento de ventos, técnica de rebocamento e recuperação, judô aquático, remo, praticas e embarcações. O treinamento era feito de segunda à sábado, em dois períodos: de manhã e à tarde, com qualquer tempo. Até hoje, não houve nenhum acidente na escola porque todas as atividades eram cercadas de proteção.
A preparação pessoal era dada pelo capitão-comandante da 3ª Companhia, Roberto Torres Barreto, auxiliado pelos sargentos Ivan e Arthur. "A vida na escola de salvamento não era nada fácil, dizia o capitão Barreto, mas o aluno se esforçava porque sabia que a vida dele também estava em jogo".
𝗗𝗘𝗣𝗢𝗜𝗦, 𝗢𝗦 𝗘𝗫𝗔𝗠𝗘𝗦
A escola de recrutas, que funcionava no José Menino, estava preparando 12 homens que nadavam em todos os estilos e estudam para enfrentar todos os perigos do mar. Natação e educação física, eram as matérias mais importantes do curso: durante o treinamento, os alunos nadavam em percursos grandes com tempo determinado.
No final dos três meses, os recrutas passavam por uma banca examinadora, formada por oficiais da Força Pública. Neste teste final, entrava todo o programa do curso: teoria e prática. Se o recruta obtivesse bons tempos e sabia resolver as situações que os oficiais propunham, tornar-se-ia um salva-vidas e iria trabalhar nos postos de salvamento. Se não conseguisse passar no exame, iria prestar serviços no quartel do Corpo de Bombeiros.
O Serviço de Salvamento de Praia, que fazia parte do 1° Grupamento de Bombeiros de Santos, cuidava da segurança dos banhistas em Santos, São Vicente e Guarujá e tinha 18 postos de salvamento em diversas áreas sob sua responsabilidade.
𝗩𝗘𝗡𝗖𝗘𝗥 𝗨𝗠𝗔 𝗤𝗨𝗘𝗦𝗧Ã𝗢 𝗗𝗘 𝗧É𝗖𝗡𝗜𝗖𝗔
Os Postos de Salvamento estavam assim distribuídos: 1 em Mongaguá; 3 em São Vicente; 6 na orla de Santos um na Ilha das Palmas; 6 no Guarujá. Havia ainda uma garagem náutica que trabalhava com 4 lanchas de patrulha e uma de emergência que tinha ligação permanente com os setores.
Em Santos, os postos de salvamento 1, 2, 3, 4 e 5 localizavam-se perto dos canais e foram construídos em 1929. O posto 6 foi construído em 1961. Em São Vicente, o posto 02, localizado na praia do Itararé, era o mais antigo; o posto 05, no Gonzaguinha, foi construído em 1965.
Em Mongaguá, o posto foi construído pelo Lions Clube e entregue à Prefeitura local em 7 de dezembro de 1968, O Posto de Salvamento, ainda não estava funcionando, tudo dependia do convênio com o Estado que deveria ser assinado dentro de um mês. O poste 8, localizado na Ilha das Palmas, estava aproveitando a própria dependência náutica da ilha.
No Guarujá estavam funcionando estes postos: 11, na praia do Bueno (em frente à colônia de férias do funcionário publico); 12, em frente ao edifício Sobre as Ondas: 13 e 14 na Praia das Pitangueiras e 15, na Praia da Enseada. O posto 9, na praia do Guaiuba, estava interditado pela Capitania dos Portos.
𝐑Á𝐃𝐈𝐎 𝐀𝐓É 𝐎 𝐅𝐈𝐌 𝐃𝐎 𝐌Ê𝐒
Os 18 postos possuiam todo o material para salvamento: ressuscitadores, sandolins duplos, nadadeiras, macas e camas clinicas. A comunicação era feita por telefone mas até o final do mês seria instalada a nova rede de radio.
Em todos havia alto-falantes que teriam seus amplificadores substituídos. Neles, os salva-vidas davam avisos sobre as correntes marítimas, informavam a hora certa e faziam advertências aos banhistas de meia em meia hora.
Os postos de salvamento não trabalhavam com medicamentos de urgência, mas o serviço farmacêutico da Força Publica já tinha dado ordem para que tivessem todo o material necessário para os primeiros socorros.
Os postos de salvamento vigiavam os banhistas da terra para o mar e as quatro lanchas do serviço de salvamento se encarregavam da segurança de mar para terra. As lanchas ficavam na garagem náutica e eram distribuídas pelos setores conforme a necessidade. Havia ainda uma lancha de emergência que trabalhava quando qualquer outra tinha que sair do setor.
O efetivo de salva-vidas não tinha um numero igual em todos os postos. Eles eram distribuídos conforme a área a ser coberta, ou o numero de atendimentos e locais que apresentavam maiores acidentes geográficos.
𝗤𝗨𝗘𝗥𝗘𝗠 𝗠𝗔𝗜𝗦 𝗣𝗢𝗦𝗧𝗢𝗦
A maioria dos postos de salvamento existia há mais de 15 anos e o comando do Corpo de Bombeiros afirmava que nem todos estavam em condições de atender a qualquer problema que aparecesse. Ainda havia uma serie de necessidades para podermos solucionar todas as dificuldades. As unidades de São Vicente estavam precisando de uma reforma total e era necessária a criação de mais três postos.
Em Santos já havia cido encaminhado à Prefeitura o pedido para que construísse mais três postos de salvamento em convenio com o governo estadual. Havia áreas muito grandes que eram cobertas por só um PB que fica sobrecarregado.
Os locais de maiores necessidades eram: entre o canal 1 e 2, em frente a Igreja do Embaré, e em frente ao Aquário Municipal, onde seriam construídos os postos 1,5: 5,5 e 7. O posto 1,5 ficaria em frente ao edifício Universo Palace e facilitaria o serviço do Posto de Salvamento 1 que fazia a cobertura do canal 1 até o limite com São Vicente. O 5,5 serviria para dar proteção à área entre o Boqueirão e o posto 6. A criação do posto 7 viria desafogar a atividade do posto 6 que tinha toda a Ponta da Praia sob sua responsabilidade.
𝗖𝗥𝗜𝗔𝗡Ç𝗔𝗦 𝗣𝗘𝗥𝗗𝗜𝗗𝗔𝗦
O trabalho maior dos Postos com crianças perdidas, ocorrências que aumentavam durante a temporada em que as praias ficavam repletas de turistas.
As crianças eram levadas à policia ou ao Juizado de Menores e isso causava problemas para os salva-vidas e para os pais que precisavam trocar a roupa de banho para poder entrar nesses lugares. Agora, o sistema era diferente. Quando uma criança era levada a um posto de salvamento, os salva vidas ficavam encarregados de distraí-la até que os pais escutassem os avisos que eram transmitidos pelos alto-falantes de todos os postos.
Em 1969, das 599 ocorrências, 354 foram casos de crianças perdidas. Os outros serviços foram divididos entre: auxilio à policia, 36; objetos achados,17; auxilio a banhistas, 32; pesquisa de cadáver, 17; salvamento com vida, 113: salvamento sem vida, 12; socorro a embarcação com tripulantes, 5; socorro a embarcação sem tripulantes, 2; serviços extraordinários, 12.
𝗦𝗨𝗥𝗙𝗘 𝗗𝗔 𝗧𝗥𝗔𝗕𝗔𝗟𝗛𝗢
O surfe e as embarcações particulares eram duas coisas que davam muito trabalho aos salva-vidas. Desde 8 de fevereiro de 1968, eles passaram a fiscalizar a pratica do surfe em todas as praias de Santos, São Vicente e Guarujá, de acordo com a portaria nº 178 do delegado auxiliar Ari Bauer.
Essa fiscalização tinha causado problemas: se havia impedimento da pratica do surfe em certos lugares, os esportistas reclamavam muito, se o surfe ficava livre de proibições, as reclamações vinham dos banhistas. Como o problema não estava solucionado, haveria outra reunião para reformular a portaria que regulava a pratica do esporte. "O surfe exigia nossa atenção com qualquer tempo: no verão o mar estava mais calmo, mas havia mais gente; no inverno, quando diminuía o numero de banhistas, o mar ficava mais agitado".
Havia também um acerto entre a Capitania dos Portos e Corpo de Bombeiros, para a fiscalização das embarcações particulares. No serviço de salvamento, as lanchas que faziam o policiamento de mar para terra é que ficavam encarregadas desse setor.
Os salva vidas também faziam uma proteção preventiva aos banhistas através de planos de advertência que eram colocadas conforme as exigências da maré, e avisos pelo sistema de alto falantes impedindo que os banhistas se afastassem muito da praia. Eram feitas ainda preleções nas escolas para primeiros socorros em acidentes no mar, principalmente em relação à respiração artificial, que era muito necessária nos casos de salvamento com vida.
𝗦𝗢𝗥𝗩𝗘𝗧𝗘 𝗔𝗖𝗔𝗕𝗔 𝗖𝗛𝗢𝗥𝗢
No meio de todo o trabalho serio que o salva-vidas executava durante as 24 horas de serviço, sempre surgiam casos curiosos e inesperados que ajudavam a quebrar a rotina. A maioria desses casos estava ligada as crianças que ficavam nos postos de salvamento quando se perdiam dos pais.
Num domingo de temporada, 17 crianças foram entregues no posto 3. O sargento de plantão começou a contar historias e as crianças ficaram quietas até que uma menina resolveu chorar. O coro aumentou e em pouco tempo as 17 crianças gritavam: quero minha mães. Um carrinho de sorvete resolveu o problema: todas as crianças pararam de chorar para chupar picolé.
Mas a grande surpresa foi a de um japonesinho de dois anos e meio que colocou o salva vidas numa posição especial. Quando acabou e primeiro sorvete, ele puxou a calça do sargento e disse: ou você me da outro sorvete ou eu começo a chorar de novo. A solução foi contentar a criança até que a mãe viesse buscá-la.
𝗙Á𝗖𝗜𝗟 𝗣𝗘𝗥𝗗𝗘𝗥 𝗗𝗘𝗡𝗧𝗔𝗗𝗨𝗥𝗔
Outro fato especial estava ligado aos objetos achados. Quando iniciavam o turno de serviço, os salva vidas percorriam toda a área que tinha sob responsabilidade e todos os objetos encontrados eram levados no posto de salvamento. Entre coisas mais achadas durante a fiscalização diária estavam os documentos e as dentaduras. Só no posto 1, havia uma caixa de pontes e dentaduras que geralmente ficavam guardadas no Posto de Salvamento. Mas havia casos em que a pessoa resolvia ir buscar a dentadura e ai começava o problema: reconhecer qual era a sua.
"𝗢𝗡𝗧𝗘𝗠 𝗛𝗢𝗝𝗘 𝗘 𝗦𝗘𝗠𝗣𝗥𝗘"

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